As onças-pintadas de Mamirauá vivem normalmente nas árvores durante a estação das cheias: caçam, acasalam, descansam, criam seus filhotes. Esse comportamento existe apenas aqui!
Existem muitas experiências marcantes na vida de uma pessoa que é apaixonada por vida selvagem, encontrar uma onça-pintada, Panthera onca, certamente é uma delas.
A Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, dentro da qual está localizada a Pousada Uacari, apresenta a maior densidade conhecida de onças pintadas no mundo: são estimados 16 indivíduos a cada 100 km². Apesar disso, ver o maior felino das Américas por aqui não é nada fácil, a floresta é densa e as onças pintadas são bem conhecidas pelo comportamento elusivo. Normalmente vemos vestígios de que esses animais andam bem à vontade por aqui, nas trilhas que fazemos na seca não é incomum encontrarmos as pegadas delas por exemplo.
Desde que cheguei por aqui, no segundo semestre de 2019, fomos surpreendidos com alguns poucos avistamentos espontâneos (eu estava num deles!! 😀 ), inclusive no dia em que cheguei em Tefé fiquei sabendo que num dos passeios da pousada havia ocorrido avistamento de uma onça melânica, também conhecida como onça-preta ou pantera-negra, que na verdade é a mesma espécie, Panthera onca, mas que por uma mutação (que ocorre em aproximadamente 10% da população apenas) tem acúmulo de melanina, mas quando vistas sob luz é possível observar as rosetas, as pintas que são bem pronunciadas nas onças amarelas e que são únicas de cada indivíduo.
No último avistamento que tivemos notícia, nosso guia local Alan e três turistas foram surpreendidos na volta de um passeio por uma onça que atravessava o rio a nado. Aliás, as onças pintadas são uma exceção à regra de que gato não gosta de água, especialmente aqui na várzea de Mamirauá onde a água dos rios sobe em média 10 metros todos os anos, tomando conta de toda a reserva e deixando muito pouco ou quase nada de chão por pelo menos 3 meses.
Justamente por essa particularidade é que surgiu a pesquisa com onças pintadas em Mamirauá, afinal como esse mamífero terrestre lida com um ambiente em que não há chão por três meses? Uma das hipóteses principais era de que durante esse período as onças migravam para áreas não alagáveis ao redor. Os pesquisadores do Projeto Iauaretê do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá colocaram então rádio colares com GPS em alguns indivíduos e acompanharam a localização destes por um ano.
O que descobriram foi um comportamento inédito e exclusivo: as onças pintadas não apenas ficam o ano inteiro na área da reserva, mas vivem normalmente (caçam, acasalam, descansam, criam os filhotes) sobre as árvores (as figueiras Apuís são as preferidas) durante a cheia. Através dos colares os pesquisadores podem também localizar as onças em campo e assim aprender mais sobre a ecologia destes felinos no ambiente de várzea. Eles aprenderam, por exemplo, que a dieta das onças também muda, na seca se alimentam mais de jacarés e já na cheia caçam preguiças e macacos guariba, que são animais arborícolas que comem folhas (e portanto tem um metabolismo mais lento, facilitando a caça nas alturas).
É possível integrar uma dessas expedições no programa Jaguar Expedition, pacote especial oferecido pela Pousada Uacari. A ideia é oferecer aos hóspedes a oportunidade de acompanhar os pesquisadores do Projeto Iauaretê nos monitoramentos, e assim observar esse grande felino em seu ambiente natural, gerando ainda educação ambiental para visitantes e para a população local (que atuam como guias, assistentes de campo), renda para as comunidades locais e para a pesquisa e conservação das onças pintadas na Amazônia.
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Créditos (imagens e texto): Cynthia Lebrão
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